O Redentor, sabendo que Judas se aproximava acompanhado
dos judeus e dos soldados, levanta-se, banhado ainda no suor da agonia mortal.
Com o rosto pálido, mas com o coração todo abrasado em amor, vai-lhes ao
encontro para lhes entregar nas mãos, e vendo-os chegados perto, diz: “A quem
buscais?”.
– Afigura-te,
minha alma, que neste momento Jesus te pergunta também: Dize-me, a quem
buscais? Ah, meu Senhor, a quem poderei buscar senão a Vós, que descestes do
Céu à Terra para me buscar e não me ver perdido?
“Eles
prenderam Jesus e o ligaram”. Ó céus, um Deus ligado! Que diríamos se víssemos
um rei preso e ligado pelos seus servos? E que dizemos agora vendo um Deus
entregue às mãos da gentalha?
Ó cordas bem-aventuradas! Vós que ligastes o meu Redentor, Ah!
Ligai-me a Ele, mas ligai-me de tal modo que nunca mais me possa separar de seu
amor.
–
Considera, minha alma, como um lhe liga as mãos, outro o injuria, mais outro o
empurra, e o Cordeiro inocente se deixa ligar e empurrar quanto quiserem. Não
procura fugir das mãos deles, não chama por auxílio, não se queixa de tantas injúrias, nem mesmo pergunta porque é tratado
assim.
Eis,
pois, realizada a profecia de Isaías: “Foi oferecido, porque ele mesmo quis, e
não abriu a sua boca; ele será levado como uma ovelha ao matadouro”.
Mas
onde é que se acham seus discípulos? Que fazem? Já não podendo livrá-lo das
mãos de seus inimigos, ao menos que o tivessem acompanhado para defenderem a
inocência de Jesus perante os juízes, ou sequer para o consolarem com a sua
presença!
Mas
não; o Evangelho diz: “Então os seus discípulos, desamparando-o, fugiram
todos”. Qual não devia se a tristeza de Jesus, vendo que até os seus discípulos
queridos fugiam e o desamparavam?
Mas, ó céus, então o Senhor viu ao mesmo tempo todas aquelas almas
que, sendo por ele mais favorecidas, haviam de abandoná-lo depois e de lhe
virar as costas.
Antes tratado como Messias, agora como
criminoso…
Ligado
como um malfeitor, o nosso Salvador entra em Jerusalém, onde poucos dias antes
fora aclamado com tantas honras e louvores.
Passa
a desoras pelas ruas, entre lanternas e tochas, e tão grande é o alarido e
tumulto, que todos deviam pensar que se levava qualquer grande criminoso.
A
gente chega à janela e pergunta: Quem é que foi preso? E responderam-lhe:
Jesus, o nazareno, que foi desmascarado como sendo um sedutor, um impostor, um
falso profeta e réu de morte.
–
Quais não deviam ser então em todo o povo os sentimentos de desprezo e
indignação, quando viram Jesus Cristo, acolhido
primeiro como o Messias, preso por ordem dos juízes, como impostor!
Ah!
Como se trocou então a veneração em ódio, como se arrependeu cada um de tê-lo
honrado, envergonhando-se de ter honrado um malfeitor, como se fosse o Messias!
– Eis, pois, a que estado se reduziu o Filho de Deus, para nos
mostrar o nada das honras e dos aplausos do mundo!
E
como é que eu, apesar de ver um Deus tão humilhado e injuriado por meu amor,
como é que eu hei de viver tão amante dos bens fugazes da terra, ambicionar as
honras, as dignidades, as preeminências, e não sofrer o mínimo de desprezo? Ai
de mim, pecador e soberbo!
Donde,
ó meu Senhor, me pode vir tamanho orgulho, depois que mereci tantas vezes o inferno? Meu Jesus, suplico-Vos pelos
merecimentos dos desprezos que sofrestes, dai-me a graça de Vos imitar.
Proponho
com o vosso auxílio reprimir de hoje em diante todo o ressentimento e receber
com paciência, alegria e contentamento todas as humilhações, todas as injúrias
e todas as afrontas que me possam ser feitas.
Proponho,
além disto, para vos agradar, fazer todo o bem possível a quem me despreza; ao
menos falarei sempre bem dele e rogarei
por ele.
Vós,
ó meu Senhor, pelas dores de Maria Santíssima, fortalecei estes meus propósitos
e dai-me a graça de Vos ser fiel.